O nome “bactéria” desperta automaticamente em nós um sentimento de repulsa ou de alguma coisa causadora de doença. No entanto, dentro do nosso organismo habitam quantidades astronómicas de alguns destes micro-organismos, sem os quais não poderíamos viver. No cólon existem cerca de um milhão de milhões de bactérias por mililitro fazendo dele o habitat mais densamente povoado por bactérias do planeta! De facto, um corpo humano adulto é composto por cerca de 90% de bactérias, ou seja, contém cerca de 10 vezes mais bactérias do que células humanas.
As bactérias benéficas têm um papel fundamental no nosso sistema imunológico: protegem o organismo contra agressões externas, permitindo-nos sobreviver mesmo na presença de um número massivo de agentes patogénicos à nossa volta e em contacto connosco. Uma vez que a mucosa intestinal é a parte do corpo mais exposta a ataques externos, perto de 75% das células do sistema imunitário estão concentradas no trato digestivo. As bactérias presentes nos intestinos são autênticas maestrinas do sistema imunitário estimulando a resposta imunitária de forma a defender o organismo de bactérias patogénicas ou vírus ou suprimindo a reposta imunitária de forma a tolerar a presença de substâncias que não representem ameaça.
Além disso, as bactérias intestinais também participam na degradação de várias substâncias presentes nos alimentos que não podem ser digeridas pelo estômago, especialmente fibras presentes nas plantas. A ação metabólica das bactérias intestinaisleva à formação de várias moléculas, algumas delas com ação anticancerígena.
Certos alimentos funcionam como probióticos, ou seja, têm uma ação benéfica sobre a composição e a atividade da flora de bactérias residentes. Vários benefícios para a saúde e resultados terapêuticos estão associados ao probióticos. Estudos epidemiológicos sugerem que o consumo de probióticos podem ser benéficos na prevenção do cancro. Outros estudos indicam uma ação quimiopreventiva dos probióticos nos cancros do cólon, fígado e bexiga. Os efeitos anticancerígenos dos probióticos podem ser explicados pela ligação das bactérias a substâncias que podem causar mutações nas células do intestino, pela supressão do crescimento de bactérias que convertem substâncias pré-cancerígenas em cancerígenas ou simplesmente pela ação estimuladora do sistema imunitário.
A ação protetora de uma flora intestinal saudável não se esgota na prevenção do cancro ou de outras doenças, de acordo com um estudo recente poderá ter um papel importante na sobrevivência aos tratamentos como a quimioterapia. Os tratamentos atualmente disponíveis para tratar o cancro, como bem se sabe, têm efeitos colaterais pesados. Joga-se um equilíbrio delicado entre a morte do tumor ou do paciente. Importa muito saber de que forma podemos proteger o doente da ação debilitante desses tratamentos.
O laboratório de Jian-Guo Geng descobriu um mecanismo biológico que preserva o trato gastrointestinal em ratos aos quais foi administrada doses letais de quimioterapia. De acordo com Geng, “todos os tumores de diferentes tecidos e órgão podem ser destruídos com altas doses de quimioterapia e radioterapia, mas o desafio atual para o tratamento cancros em fase avançada metastizados é que se pode acabar por matar o doente antes de matar o tumor“.
De acordo com o estudo, quando certas proteínas se ligam com moléculas específicas em células estaminais do intestino, isso pode estimular a regeneração e reparação intestinal em ratos. As células estaminais de forma naturalreparam órgãos e tecidos danificados, mas as quantidades normais destas células no intestino não conseguem lidar com os destroços deixados pelas doses letais de quimioterapia e radiação necessários para tratar de forma bem-sucedida tumores em fase avançada.
A utilização de certas substâncias (R-spondin1 e Slit2) em ratos expostos a doses letais de quimioterapia evitou que morressem. Estas moléculas promovem a produção de células estaminais nos intestino levando a uma maior regeneração das células e resistência aos danos. De acordo com os autores, 50 a 75% dos ratos tratados com estas moléculas e expostos a quimioterapia sobreviveram, enquanto todos os outros morreram. No futuro, se estas descobertas mostrarem ser semelhantes em humanos, isso poderia representar uma maior probabilidade de sobrevivência aos tratamentospara o cancro. O estudo conclui que as moléculas R-spondin1 e Slit2 podem servir de adjuvantes terapêuticos de forma a aumentar a resistência do doente à quimioterapia e radioterapia.
Este estudo vem mostrar a importância de uma flora intestinal saudável para a sobrevivência aos tratamentos de cancro. O consumo de probióticos e o evitamento de fármacos que danificam o equilíbrio da microbiótica torna-se assim provavelmente uma medida importante a implementar não só para a prevenção do cancro e de um sistema imunitário eficaz como também enquanto estamos a fazer tratamentos agressivos de quimio ou radioterapia.
Alguns exemplos de alimentos probióticos:
- Iogurte
- Chucrute
- Miso (pasta fermentada de soja)
- Kefir
- Tempeh (grãos fermentados de soja)
- Todos os alimentos ou bebidas fermentados
Referências:
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